Aguardava o ônibus num ponto de…
Aguardava o ônibus num ponto de parada do bairro. Um mendigo bêbado feito um gambá me chamou: Pshiu! Ei, ei, irmão, abre aí no Salmo 23. Eu levava um romance do James Joyce na mão. Não é a Bíblia, não, jovem, respondi. Ele: Abre aí, pô! É a Bíblia sim, seu poura. Abre aí no Salmo 23. Ignorei. Daí ele começou a recitar versículos bíblicos e a acusar os males do mundo. Depois esqueceu de mim e passou a zombar de umas mulheres que passavam: Fala aê, meu suco de laranja. Não, você não, bagaço! E gargalhava.
Já no ônibus, lembrei do testemunho de um professor de escola pública que, segundo ele, costuma carregar sempre um livro consigo, e várias vezes teria acontecido: alunos olham, olham, olham... e perguntam: É a Bíblia, fessor?
Para o brasileiro da minha classe social pra baixo, ou seja, entre o pobre remediado e o miserável, o livro praticamente não existe. Aliás, apenas um existe: a Bíblia, não existem outros além da dela — e mesmo ela, não sei se a leem.